09/07/11

A CATEQUESE COMO MEIO DE CONHECER UMA COMUNIDADE

Introdução

O presente trabalho tem como finalidade dar uma resposta ao desafio que surgiu da Unidade Curricular de Metodologias de Investigação em Pastoral lançado pelo Dr Luís Figueiredo, no sentido de fazer uma proposta metodológica a partir das técnicas da recolha de dados da pesquisa qualitativa do modelo do Método do Discernimento proposto por Sérgio Lanza. Para isso, contamos com a observação e o diálogo feito com os catequizandos do Centro de Catequese Interparoquial do Alto Mouro. Desde o seu início no ano 2005 até ao presente, fomos vendo e registando a evolução dos catequizandos neste processo de aprendizagem. Podemos chegar a várias interpretações da vivência da fé das comunidades envolvidas neste projecto e ter uma leitura mais próxima da realidade das famílias e comunidades, no tocante a questões pastorais e a forma como vivem e manifestam a sua religiosidade (fé), através dos catequizandos envolvidos.
Queremos com este trabalho, apresentar uma visão real e algumas mudanças que podemos operar depois do conhecimento que nos foi proporcionado pelos indivíduos envolvidos.
Contamos para isso com a colaboração dos catequistas, de um modo particular da Catequista Márcia Afonso que nos falou da sua experiência pessoal neste trabalho.
Dada a evidência das “transformações sócio-eclesiais, é necessária uma reflexão sobre o tecido paroquial multissecular”. A paróquia de tipo geográfico, hoje em dia, é insustentável, não respondendo, portanto, às necessidades que são evidentes em alguns meios das nossas dioceses.
A mobilidade acelerada dos membros das comunidades, a redução do número de párocos, a anexação de paróquias, a despovoação dos meios rurais, o recrudescimento, o surgimento de novos e diferentes espaços de convívio e sociabilização, a alfabetização em larga escala que proporcionou o acesso à informação global e diversificada, a outras formas de pensar e viver, novas terras, culturas, religiões e as diversas liberdades (imprensa, religiosa, política, expressão…), são alguns fenómenos sociais irreversíveis que põe em jogo a mudança do sistema paroquial. A geografia deixou de ser o critério fundamental para a delimitação da paróquia.
Causas e importância do VAT II, um ponto fundamental na reforma. Urgente mudança de paradigma: voltar às origens, da pastoral de manutenção à pastoral evangelizadora e missionária – a igreja perde fiéis é preciso ir à procura deles… Uma provável solução são as “unidades pastorais”, mesmo sabendo que não será a “cura” para este problema. Contudo, será um caminho a fazer, optando por um trabalho em equipa. Certamente, sem pôr em causa as comunidades primárias e respeitando a sua hierarquia, num ambiente real de co-responsabilidade.

A catequese como método de conhecimento e projecção pastoral
A catequese é um pequeno mundo que deixa transparece o ambiente comunitário e familiar. No contacto semanal com os catequizandos conseguem-se observar e analisar evoluções que de outra forma seria difícil. Podemos, portanto, dizer que a catequese é um pequeno grande espelho de uma comunidade formada por famílias com pensamentos e, porque não dizê-lo, costumes diferentes que se reflectem a posteriori na comunidade à qual pertencem.
Assistíamos há alguns anos a uma catequese fechada em si mesma, que não se abria à comunidade, que com ela não interagia, que recitava fórmulas e doutrinas ininteligíveis: uma catequese condenada ao fracasso, uma catequese anti-relação, na qual nem participa a família nem a comunidade, nem os próprios catequistas, envolvidos que estavam num emaranhado de rotinas, sem espírito, sem trabalho, desprovidas de reflexão, no fundo, sem luz. O resultado manifestou-se em famílias, e consequentemente, comunidades fechadas, sem espaço para diálogo, mal formadas e cujo interesse era satisfazer interesses, pequenos costumes e rotinas, a vontade do avô ou da avó, alimentar uma fé desfasada da autêntica Fé em Jesus Cristo que se alimenta do Evangelho e da vivência – não consumo – sacramental como graça e sinal da participação de Deus na vida de cada um. A base dessas insolvências era a estatística, o número daqueles que entravam e saíam da catequese, mas sem quaisquer fundamentos. Interessava, sobretudo, o número dos que faziam a profissão de fé com êxito. A comunidade e as famílias pensavam assim. Sabia-se disso pela forma de abordagem dos catequizandos, pela pressa, pelo desinteresse.
Este foi o modo de pensar e agir durante algum tempo e via-se claramente nos pais e na comunidade esta mentalidade. Os catequizandos confirmavam-no pela sua postura, conversa, desânimo e num ânimo simultâneo de partir por outros caminhos para eles mais abertos. Uma catequese de verão, aliada ao profundo desconhecimento de Deus. Daqui se parte para o destino de muitas famílias e comunidades pequenas resistentes à ideia de mudança, de abertura a outras comunidades: incompreensão, barreiras intransponíveis, pouco diálogo, convivência inexistente, falta de sentido, isolamento…
Perante tal cenário depreendeu-se que a alternativa, o futuro, passava pela interparoquialidade que é, sem dúvida, um caminho aberto a grandes possibilidades, Neste contexto, muitas mudanças foram necessárias operar, sobretudo na transformação de mentalidades, no aniquilamento de bairrismos, na projecção de novas formas de viver a e na comunidade. Tempo. Foi necessário tempo e paciência, sentido de comunhão, humildade, escuta, sensatez, acreditar que pelo Espírito Santo se conseguem coisas extraordinárias. Era preciso actuar nos pontos essenciais e críticos, arriscando numa mudança com sentido de aposta na reflexão, no respeito pelo trabalho dos outros, no acolhimento e no diálogo, mais-valias para apresentar Cristo.
Para ultrapassar questões complexas e polémicas à partida, foi necessário pensar sempre sobre a melhor forma de o fazer. Apesar de muitas renitências, o primeiro passo foi dado. Inicialmente, foi-se sentindo, no diálogo com os catequizandos, que os pais se sentiam um pouco deslocados, por terem de sair dos seus espaços, da sua comunidade, pensando que assim estariam a perder a identidade. O mesmo tocava as comunidades, que achavam estar a perder as crianças. O afastamento destes sentimentos exigiu por parte de todos um esforço de integração e de adaptação, sem que tal anulasse a identidade de cada local. Estava fora de questão voltar atrás no tempo, no Evangelho que apela ao sentido de comunhão, de comunidade, de união, de relação. Aos poucos, evidentemente – nenhuma mudança se opera do dia para a noite – as pessoas foram-se sentindo acolhidas e parte integrante de um novo projecto de comunidade. Hoje consegue-se ver o resultado de tanto trabalho, no fundo de evangelização. Nesta procura de renovação das comunidades, a catequese mostra como as famílias se modificam. A exigência que os começa a rodear. A mudança é paulatina, mas acontece. Os filhos trazem os pais. Eles mesmos o dizem e, fazendo parte integrante e activa da catequese por meio das diversas dinâmicas que se foram e vão criando, mostram o modo de viver de toda a comunidade, denotam as transformações de mentalidades que essa mesma comunidade vai sofrendo, que se reflectem na forma como vivem a sua religiosidade, a sua fé… Como vivem e como dela dão testemunho. Apostou-se na organização, na convivência, no diálogo, algo a não descurar. A catequese envolve muito a comunidade cristã e isso é verificável pela acção dos catequizandos no anúncio do Evangelho que é, sem dúvida, o principal objectivo. Para o atingir, o testemunho é sempre o melhor aliado. Todos se convergem para um mesmo objectivo. E pela catequese se mostra que tal é possível. Pelo testemunho dos próprios filhos, os pais e a comunidade sentem-se acolhidos. E com aqueles que ainda não acontece, o trabalho continua: é preciso discernimento, acolhimento, diálogo.
Não quer isto dizer que tudo está feito. Novas mudanças podem aparecer, novos objectivos a levar a efeito. Mas em tudo é preciso reflectir, organizar, discernir o que melhor faz sentido, à luz daquele que nos move, Jesus Cristo. Não poderá haver lugar para egoísmos, antes para comunidades abertas que, estando juntas, não perdem a identidade própria, o seu modus operandi, porque se sabem integradas numa num projecto maior, o de Deus.


Discernimento em Sergio Lanza

Sergio Lanza apresenta-nos uma teologia do discernimento sendo o seu método teológico. Vê a realidade à luz do Espírito Santo, que acolhe, exercitando-se na leitura dos sinais do tempo. É um método de acção e compreensão, não é de teor técnico, mas activo e responsável, inspirado pelo espírito que procura renovar as comunidades.
O discernimento tem como referência a eclesiologia de comunhão, ou seja, é um trabalho que a comunidade exerce em conjunto, um trabalho comunitário e não cada um isoladamente. Sendo um método teológico exige a conversão como transformação interior e implica uma “maturidade sapiencial”, isto é, dar uma orientação à vida baseada na humildade, na paciência e na sensatez.
O acto de discernimento exige competências, na medida em que deve ser um acto inteligente, saber separar e optar e tomar uma decisão. Deve testemunhar a caridade, formando comunidades abertas e acolher todos os seres humanos.
O discernimento é o centro do método e o sujeito é toda a comunidade cristã, activa e participativa. Este método dedica sempre um tempo à verificação dos dados e dos resultados, sendo este um momento indispensável. Daqui vai resultar o projecto para a comunidade. Um projecto de co-responsabilidade e comunhão, onde estão presentes o perdão, o diálogo e a escuta. Este projecto vai ajudar a comunidade, e a Igreja em geral, a crescer e a se reedificar num tempo e num espaço. Portanto, é um projecto dinâmico e aberto, mas também sujeito à verificação.
A catequese, no trabalho realizado, é, pela proposta que apresentamos, o local mais genuíno para este discernimento. É importante porque desta forma conseguimos ter uma leitura mais realista da realidade e a forma como projectar a acção pastoral.

Raul de Oliveira Fernandes

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